Gravura de Gustave Doré ("Me encontrei numa selva escura..." ( Dante Alighieri, Divina Comédia)
Embocaduras (de Alma Welt)
Perdida a mão do sal da tua poesia
É como ter perdido a embocadura *
De tua flauta conhecendo a partitura
Ou sabendo de cor tua sinfonia...
Nada mais podes fazer senão parar
E pausar a pena ou o teclado:
A poesia não é terra de se arar
Nem jardim, menos ouro do Eldorado.
O portal desesperado não esperes *
E o teu cicerone é um tanto rude, *
Talvez lobo e leopardo consideres. *
Podes bem encontrá-lo à revelia,
Foste parar na Terra da Agonia,
Perdida a tua louca juventude...
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Notas
* Perdida a mão do sal da tua poesia
É como ter perdido a embocadura
De tua flauta conhecendo a partitura * - alusão à perda súbita do jeito para a culinária ou o jeito certo de assoprar o bocal ou palhetas num instrumento de sopro, fenômeno imponderável que pode acontecer com os cozinheiros e músicos. Aqui, no caso, será uma comparação com o súbito estancamento do fluxo de inspiração que pode ocorrer ocasionalmente com os poetas...
*O portal desesperado não esperes - O portal do Inferno da Divina Comédia, de Dante, em que estava escrito: "Deixai toda esperança, vós que entrais".
*E o teu cicerone é um tanto rude - na Comédia o cicerone do Poeta era o polido Virgílio, poeta romano da antiguidade. Alma adverte que agora até o guia será adverso...
*Talvez lobo e leopardo consideres... - Alma se refere às duas feras que acuaram o poeta Dante no meio da Selva até diante do portal do Inferno, onde não pode senão adentrar, para não ser devorado. Agora, Alma sugere que, a esta altura, é melhor encará-las pois já não estás na tua louca juventude que preferiu atravessar o sinistro portal...
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