A Morte

A Morte
óleo s/tela de Guilherme de Faria 1967

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

O Corpo Imaginário (de Alma Welt)

Sim, nosso corpo é imaginário,
Efêmero ele passa e se dilui
No fluxo contínuo sem horário,
No espaço em que pouco denso flui.

Derretemos como vela em devoção
Sem permanência sequer de boas obras
Nem dos pensamentos a intenção
Ou de nossa astúcia as vis manobras.

Mas a alma, essa sim, tem consistência
Pelo menos duradoura, não fugaz
Do corpo que é só pura aparência.

E assim, em nossa alma confiemos
Pois nela um universo se compraz,
E cabe todo no sonho que vivemos...

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Empíreo (de Alma Welt)

A morte é o Mal, eis a verdade,
O próprio Demônio sobre o Mundo;
A ele Deus deixou uma metade
Do seu reino e justo o lado imundo.

Senão, reparem, vejam: treme
A natureza diante da ameaça...
Ao menor perigo grita e geme
E todo dia e só dia de caça.

Por isso entre os gregos só havia
O Hades para todos os mortais,
Embora para poucos outra via:

O Empíreo ou Ilhas Bem-Aventuradas
A que alguns chegavam sem os ais,
Que dos heróis as almas são aladas...

domingo, 7 de agosto de 2011


O Eterno Cavaleiro- Lito de grande formato, de Guilherme de Faria, 1975, 47x69cm (versão em sangüíneo)

O Eterno Cavaleiro (Alma Welt)
(sobre uma lito do Guilherme de Faria)


Sob um certo e negro timbre da visão
Se pode ver o Eterno Cavaleiro
Sobre o campo entulhado em confusão
De corpos ceifados, sem celeiro,

Lançados sobre a face do planeta
Em terrível multidão de destroçados
Nem sequer semeados em valeta
Sem a cruz ou crescentes inclinados.

É o Triunfo daquele “miglior fabro” *
Que Deus deixou por conta do terror,
Pelo amor que tem pelo macabro

Que O fez caprichar na estrutura:
Branca ossada risonha ao seu dispor
Por mais tempo do que nossa carne dura...


Nota
* Il miglior fabro" - como Dante Alighieri se referiu ao poeta Guido Cavalcanti, preconizando o Poeta como o Melhor Fazedor ( ou fabricante, de imagens). Quem teorizou sobre isso foi o grande poeta e ensaista de poesia, Ezra Pound.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Soneto do Fim e do Medo (de Alma Welt)

Quando chegar o fim, que sei e espero,
Não me assalte o desamparo e medo,
Mas seja grande encontro com o vero
Que deixa o moribundo mudo e quedo.

Tenho medo do medo, é o que tenho.
O desespero é a grande ameaça,
Que na hora do fogo sob o lenho
Até santo bendizer faz à fumaça.

O Medo e a Dor são quase unos,
Nascidos com minutos de distância
Entre os seus partos importunos.

E esses gêmeos tristes e inquietos
Convivem com a Vida e sua ânsia
De alegria sob o céu e sob os tetos...

08/01/2007

domingo, 12 de junho de 2011

A Assombrada (de Alma Welt)

Alma viva assombrada pela morte,
Com ela tive grande intimidade
Que mudou-me o tom da realidade
E fez a minha vida bem mais forte.

Alto preço a pagar pela Poesia,
Acordar na alta noite em pleno frio
A apertar o peito em agonia
De onde brotam versos como um rio...

Ou então correr para o espelho
Para reintegrar-me em minha imagem
Que quer dissolver-se no vermelho

Do sangue desta vida, ou cabeleira
Que coroa a forma branca de miragem
Que anseia já perder-se na poeira...

domingo, 15 de maio de 2011

Para entreter as horas ( Alma Welt)

Não arrastei a vida, andei na frente
Com o cabelo e o rosto ao vento
Desbravando viva e bravamente
As horas em seu próximo momento.

Aventura maior do que estar viva
Não há, como estar ao próprio ritmo
Do primeiro e último conviva,
Nosso coração e rei legítimo.

Se me pus a rechear o entremeio
De poemas e sonetos bem rimados,
Para entreter as horas foi um meio

De nublar-me a certeza de morrer
Unindo o prazer aos meus cuidados
De em mim mesma restar, permanecer...

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Testamento ( de Alma Welt)

Ao vento não lancei os meus desejos,
Mas em versos ritmados no papel
Para em rimas plasmar os meus ensejos
E os caprichos, tantos, em tropel

Formando com eles as milícias
Dos meus sonhos loucos de poeta,
Não só os dos gozos de delícias
Mas também os místicos, de asceta.

Talvez só seja ingênua aspiração
De restar ao menos no papel
Por mais de uma futura geração...

Para quê? me perguntam amiúde
Os que apostam da matéria a finitude
E descrentes acreditam só no céu...

15/01/2007

sexta-feira, 18 de março de 2011

O fantasma dos sonetos (de Alma Welt)

Permanecer viva em meu escrito...
Eis a esperança que ainda guardo,
E sendo isso o derradeiro Mito
Que me mantém acesa, com que ardo.

Um soneto mais, que insensatez!
Não posso parar, devo ir em frente.
Acabar é dar o sim ao pretendente
Que hospedado espera a sua vez.

Toda a minha vida entretecida,
Concentrada afinal em tipos pretos
A me fazer mais íntegra e assumida!

Já mal existo fora de um poema,
E sou mais e mais nestes tercetos,
Eu, fantasma vivo, que ainda teima...

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Sonetos como um pássaro (de Alma Welt)

Sonetos como um pássaro (de Alma Welt)

Criar sonetos como um pássaro
Que canta por cantar e abrir o bico
Ou porque tendo já descido ao tártaro
Subiste e sem culpa nem um tico.

E então ao leitor lembrar Camões
Sem poderem dizer que o imitas
Pela forma pouco lusa que compões
Ou pelos dois olhos com que fitas

A tua realidade que é só tua
Sendo outrossim de toda gente
Que persegue a palavra que flutua

Ao léu, por aí, no espelho astral
Onde o mundo então seja diferente
Mas nunca invertidos bem e mal...

(sem data)

sábado, 8 de janeiro de 2011

Cosmogonia (de Alma Welt)

A força e lei maior que tudo une
É a da Gravitação Universal.
Ela é Deus e o Amor que nos reúne
E também cria o habitat natural

Onde prosseguimos procurando
O que está em nós, o mesmo Amor,
Que ao buscar fora de nós criamos dor
Que também vai se aglutinando

Num anti-universo que é o Horror
Que gera anti-matéria, que é o Mal,
Se insistirmos em juízo de valor.

Mas para entender esse imbróglio,
Caminhando sob o grande Festival,
Minhas estrelas simplesmente olho...

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Titã (de Alma Welt)

Creio o homem ser maravilhoso
Em seu funcionamento tão complexo.
Nem me refiro só ao amor e o sexo
Mas ao nosso cérebro espantoso.

Não me venha então com a coisa vã
De visões negativas, derrisórias;
O homem em si mesmo é um Titã,
Só civilizações são provisórias.

Afinal somos feitos das estrelas,
A ciência o provou e é verdade,
E até nos caberá também fazê-las.

E me espanta que o Bardo já sabia
Quando o colocou na Tempestade,
Como no próprio cerne da Poesia...

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Veronica’s Veil (de Alma Welt)

Plasmar-me vero ícone em poesia
Foi pra mim verdade e confissão,
Pois jamais em falsidade conseguia
Resistir ao linguajar do coração.

Não há como mentir ou falsear
Tua verdadeira face ao mundo
Se tiveres alma e palma que rimar
E chegar do coração ao poço fundo.

Pois se fores falso nem atinges
O que se denomina de poema,
O lenço que com más tinturas tinges...

Quais cabelos as raízes mostrarão
A cor de uma velhice que se tema:
As mais feias rugas de expressão...

(sem data)

sábado, 1 de janeiro de 2011

Balanço dos sonetos (de Alma Welt)

Só sei que em vão na vida não passei,
Deixando a minha alma por aí...
Que em milhares de sonetos registrei
Cada forte ou vão momento que vivi.

Pensando bem, não foram vãos momentos,
E não por serem fortes de lembrar
Mas pelo aval do olhar, não sentimentos,
Que estes mesmos só costumam enganar.

Sentimentos jamais, não, nem pensar!
Os bons versos não são sentimentos,
Mas deverei pagar a conta de rimar,

Já que esse entre os vícios de poeta
Deu aos meus versos ao menos linha reta
Antes de se dispersarem pelos ventos...

(sem data)